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domingo, 7 de agosto de 2011

Encontrando palavras em Clarice...


Estou lendo Clarice Lispector e este trecho do livro, imediatamente, me fez lembrá-lo:

"Existe um ser que mora dentro de mim, como se fosse casa dele, e é. Trata-se de um cavalo preto e lustroso, que apesar de inteiramente selvagem — pois nunca morou antes em ninguém, nem jamais lhe puseram rédeas, nem sela — apesar de inteiramente selvagem tem, por isso, mesmo uma doçura primeira, de quem não tem medo: come às vezes na minha mão. Seu focinho é úmido e fresco. Eu beijo o seu focinho. Quando eu morrer, o cavalo preto ficará sem casa e vai sofrer muito. A menos que ele escolha outra casa e que esta outra casa não tenha medo daquilo que é, ao mesmo tempo, selvagem e suave. Aviso que ele não tem nome: basta chamá-lo e se acerta com seu nome. Ou não se acerta, mas, uma vez chamado com doçura e autoridade, ele vai. Se ele fareja e sente que um corpo-casa é livre, ele trota sem ruídos e vai. Aviso também que não se deve temer o seu relinchar: a gente se engana e pensa que é a gente mesma que está relinchando de prazer ou de cólera, a gente se assusta com o excesso de doçura do que é isto pela primeira vez". 

Clarice Lispector, em Uma aprendizagem ou O livro dos prazeres, de 1969, p. 15.

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